Autismo e Plano de Saúde: Desvendando a Relação Intrincada

por | Direito dos Autistas e Pessoas com Deficiência

Dra. Patrícia Wanderley

Dra. Patrícia Wanderley

Além de advogada, nossa especialista também é colunista no Jusbrasil.


A advogada possui dezenas de milhares de reais resolvidos em disputas jurídicas, com exelente bagagem teórica e prática em sua área de especialidade.

Introdução: O Intrigante Labirinto entre Autismo, Planos de Saúde e Leis

A síndrome do autismo, também conhecida como Transtorno do Espectro Autista (TEA), é uma condição neurológica complexa que se manifesta normalmente nos primeiros anos de vida. Pessoas com autismo podem apresentar dificuldades na comunicação, interação social e comportamentos repetitivos, contudo, a intensidade dessas características varia amplamente. Um emaranhado de desafios se apresenta quando o assunto é autismo e plano de saúde no Brasil, em grande parte devido às controvérsias legais e à falta de clareza na interpretação das leis.

Entender como a lei regula a relação entre os planos de saúde e o atendimento às pessoas com autismo pode ser um verdadeiro labirinto para os familiares e pessoas com TEA. Na tentativa de desvendar este emaranhado, este artigo se aprofunda nas questões de carência e doença pré-existente, dois conceitos frequentemente mal interpretados na área de saúde suplementar.

Este é um guia que visa esclarecer as principais questões que envolvem o autismo e os planos de saúde, e orientar a tomada de decisões baseada em direitos. Vamos abordar desde o básico sobre o autismo, passando pelas leis que regulamentam a relação entre os planos de saúde e as pessoas com autismo, até as situações de carência e doença pré-existente. Tudo isso com uma linguagem clara e precisa para facilitar a compreensão do leitor.

Índice

Preparado para desvendar esse intricado labirinto? Então, vamos lá!

Compreendendo o Autismo

O Transtorno do Espectro Autista é um grupo de condições caracterizado por dificuldades na comunicação e interação social, além da presença de comportamentos, interesses ou atividades repetitivas. Embora possa ser identificado em qualquer idade, o TEA é considerado uma “condição de desenvolvimento”, pois seus sintomas geralmente aparecem nos primeiros dois anos de vida.

Não existe um “tipo” único de autismo. A condição se manifesta de formas diferentes em cada pessoa. Alguns indivíduos podem precisar de apoio significativo em suas vidas diárias, enquanto outros podem precisar de menos apoio e, em alguns casos, viver de forma independente.

Compreender o autismo é o primeiro passo para entender como as leis e os planos de saúde interagem em relação a esta condição. Agora, vamos ao segundo passo: entender como o autismo se encaixa no contexto dos planos de saúde.

Autismo e Plano de Saúde: Direito a Cobertura Integral

No Brasil, o direito à saúde é garantido pela Constituição Federal de 1988, incluindo o direito ao acesso a serviços de saúde. E isso, é claro, se aplica também aos indivíduos com autismo. É importante ressaltar que a lei brasileira trata os planos de saúde como contratos de adesão, nos quais o consumidor adere às condições estabelecidas pelo fornecedor do serviço. Contudo, qualquer cláusula que limite de maneira injusta os direitos do consumidor é considerada nula.

Com relação ao autismo, a Lei 12.764/2012, também conhecida como Lei Berenice Piana, estabelece diretrizes para a política nacional de proteção dos direitos da pessoa com autismo. Entre elas, está a previsão de que os planos de saúde são obrigados a oferecer cobertura para o tratamento integral das pessoas com TEA.

Mas, o que significa “tratamento integral”? Basicamente, essa expressão se refere à necessidade de cobertura de todas as especialidades médicas relacionadas ao tratamento do autismo, incluindo, mas não se limitando a: psiquiatria, psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia. Além disso, inclui também a cobertura de exames, medicamentos e internações, quando necessárias.

Com isso em mente, fica evidente que, em teoria, as pessoas com autismo têm direito a uma cobertura abrangente por parte dos planos de saúde. No entanto, na prática, esse direito nem sempre é respeitado. É aqui que entram os conceitos de carência e doença pré-existente, que podem criar obstáculos à obtenção de cobertura completa. Para entender melhor esses obstáculos, precisamos primeiro entender o que são carência e doença pré-existente.

Carência e Doença Pré-Existente: Barreiras à Cobertura Integral

Ao contratar um plano de saúde, é comum nos depararmos com o termo “carência“. Em suma, carência é o período estipulado em contrato durante o qual o usuário paga as mensalidades, mas ainda não tem acesso a todas as coberturas previstas no plano. Esse período tem como objetivo proteger as operadoras de planos de saúde contra possíveis fraudes e usos inadequados do plano.

Entretanto, a Lei 12.764/2012, que mencionamos anteriormente, garante o direito das pessoas com autismo de terem acesso a tratamentos mesmo durante o período de carência. Especificamente, o parágrafo único do artigo 3 dessa lei determina que os planos de saúde não podem restringir, de nenhuma forma, a cobertura ao tratamento necessário. Isto é, eles não podem aplicar períodos de carência ou qualquer outra restrição de cobertura.

Mas, e no caso de autismo, o conceito de “doença pré-existente” é aplicável? Uma doença pré-existente é aquela que o usuário do plano de saúde já tinha antes de adquirir o plano. Normalmente, as operadoras podem limitar a cobertura para essas doenças durante os primeiros 24 meses de contrato. No entanto, isso não se aplica ao autismo, de acordo com a lei.

A Lei 12.764/2012, em seu parágrafo único do artigo 3, também estabelece que o autismo não pode ser considerado uma doença pré-existente para fins de contratação de qualquer plano de saúde. Isto é, não podem ser aplicadas quaisquer restrições de cobertura, mesmo que a pessoa já tenha recebido o diagnóstico de autismo antes de contratar o plano.

Em suma, tanto no caso de carência quanto de doença pré-existente, as leis brasileiras garantem que as pessoas com autismo tenham direito a uma cobertura integral de saúde. Contudo, como mencionado anteriormente, nem sempre esse direito é respeitado na prática. É nesse ponto que entra a importância do conhecimento da lei e da defesa dos direitos.

Advocacia e o Autismo: Defendendo os Direitos

Como vimos até aqui, a pessoa com autismo tem direitos garantidos por lei que devem ser cumpridos. Contudo, nem sempre isso acontece. Muitas vezes, é necessário recorrer à Justiça para garantir esses direitos, e é aí que a advocacia desempenha um papel crucial.

Quando falamos em advocacia, estamos nos referindo a uma profissão dedicada a defender os direitos das pessoas. A advocacia voltada para o autismo se concentra em garantir que os direitos das pessoas com este transtorno sejam respeitados. Isso inclui o direito a tratamentos de saúde, educação adequada, proteção contra discriminação, entre outros.

Existem muitos advogados e escritórios de advocacia especializados na defesa dos direitos das pessoas com autismo. Eles entendem as nuances da legislação relacionada ao autismo e sabem como lidar com os desafios legais específicos que surgem neste contexto. Para as pessoas com autismo e suas famílias, ter um advogado que entenda suas necessidades e esteja comprometido em defender seus direitos pode fazer toda a diferença.

Nesse contexto, é importante mencionar que o direito à defesa é garantido pela Constituição Federal Brasileira. De acordo com o artigo 5º, inciso LV, “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Portanto, recorrer à Justiça para defender seus direitos é um direito em si.

Para quem está em busca de um advogado especializado na defesa dos direitos das pessoas com autismo, algumas características são essenciais. Por exemplo, o advogado deve ter um bom conhecimento da legislação aplicável, deve estar atualizado sobre as decisões judiciais recentes relacionadas ao autismo, deve ter uma boa capacidade de comunicação e deve ser comprometido com a defesa dos direitos humanos. Além disso, é fundamental que o advogado esteja disposto a ouvir e compreender as necessidades específicas de cada cliente.

Recorrendo à Justiça: Quando e Como Proceder

No contexto do autismo, existem várias situações em que pode ser necessário recorrer à Justiça. Por exemplo, se uma pessoa com autismo está sendo discriminada na escola, no trabalho ou em qualquer outro ambiente, pode ser necessário tomar medidas legais para proteger seus direitos. Da mesma forma, se uma pessoa com autismo está sendo negada ao acesso a tratamentos de saúde necessários, a ação legal pode ser a única maneira de garantir esse direito.

A decisão de recorrer à Justiça nunca deve ser tomada de ânimo leve. É importante avaliar cuidadosamente a situação e considerar todas as opções disponíveis antes de tomar uma decisão. No entanto, em alguns casos, a ação legal pode ser a melhor ou única maneira de garantir que os direitos da pessoa com autismo sejam respeitados.

Recorrer à Justiça envolve vários passos. O primeiro é procurar aconselhamento jurídico. É essencial encontrar um advogado ou escritório de advocacia que tenha experiência na defesa dos direitos das pessoas com autismo. Eles serão capazes de fornecer orientação e conselhos sobre como proceder.

O próximo passo é coletar todas as provas necessárias para apoiar o caso. Isso pode incluir registros médicos, relatórios escolares, declarações de testemunhas e qualquer outra evidência que possa ajudar a demonstrar que os direitos da pessoa com autismo estão sendo violados.

Depois que todas as provas foram coletadas, o caso pode ser levado à Justiça. O processo legal pode ser longo e complexo, mas é essencial manter a paciência e a perseverança. Com o advogado certo ao seu lado, você terá o suporte necessário para navegar por este processo e garantir que os direitos da pessoa com autismo sejam respeitados.

Legislação e Autismo: O Papel Fundamental da Lei na Proteção dos Direitos

A lei desempenha um papel fundamental na proteção dos direitos das pessoas com autismo. No Brasil, existem várias leis e regulamentações que foram criadas especificamente para proteger os direitos das pessoas com deficiências, incluindo o autismo. Estas leis proporcionam proteções abrangentes e garantem que as pessoas com autismo tenham acesso igual a oportunidades em áreas como educação, emprego, habitação e saúde.

A Lei Federal 12.764, também conhecida como Lei Berenice Piana, é um exemplo de uma lei importante que foi criada para proteger os direitos das pessoas com autismo no Brasil. Nomeada em homenagem à mãe de uma criança com autismo que lutou incansavelmente pelos direitos de seu filho, a Lei Berenice Piana reconhece o autismo como uma deficiência para todos os efeitos legais. Isto tem implicações significativas para a forma como as pessoas com autismo são tratadas no sistema jurídico e abre o caminho para outras proteções legais.

A Lei Berenice Piana também estabelece que as pessoas com autismo têm direito ao acesso à saúde, à educação, ao lazer, ao trabalho, à assistência social, entre outros. Esta lei reconhece o autismo como uma condição de saúde e estabelece que as pessoas com autismo têm direito a um plano de saúde e a outros tratamentos médicos necessários.

Além disso, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), Lei Federal 13.146, também oferece proteções adicionais para pessoas com autismo. Esta lei estabelece que todas as pessoas com deficiências, incluindo as pessoas com autismo, têm o direito de serem incluídas em todos os aspectos da sociedade e de participar plenamente da vida pública. Isso inclui o direito à igualdade de oportunidades, à independência e à autodeterminação.

É essencial para os pais, cuidadores e pessoas com autismo conhecerem essas leis e regulamentações e entenderem como elas podem ser usadas para proteger os direitos das pessoas com autismo. Embora a legislação possa parecer complexa e difícil de entender, um advogado experiente pode fornecer orientação e conselhos e ajudar a navegar pelo sistema jurídico.

Autismo e Plano de Saúde: Entendendo seus Direitos

A saúde é uma área em que a lei oferece proteções significativas para as pessoas com autismo. No Brasil, as leis de saúde garantem que as pessoas com autismo tenham acesso ao tratamento médico de que necessitam. Isto inclui terapia comportamental aplicada (ABA), terapia ocupacional, fonoaudiologia, entre outras terapias recomendadas por profissionais de saúde. Os planos de saúde são obrigados a cobrir esses tratamentos, sem limite de sessões, e independente da idade do beneficiário.

De acordo com a Lei Federal 12.764, as empresas de plano de saúde não podem recusar cobertura a pessoas com autismo. Além disso, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estabeleceu que o autismo deve ser coberto pelos planos de saúde, e que a negação de cobertura é considerada uma prática ilegal.

Entretanto, apesar dessas proteções legais, muitas famílias enfrentam dificuldades em fazer valer seus direitos. Algumas empresas de plano de saúde podem tentar negar cobertura, alegando que o autismo é uma condição pré-existente. No entanto, é importante lembrar que, de acordo com a lei brasileira, o autismo não pode ser considerado uma doença pré-existente para fins de cobertura de saúde.

Se a cobertura for negada, as famílias podem apresentar uma queixa à ANS ou procurar assistência jurídica. Em muitos casos, os tribunais têm decidido a favor das famílias, reforçando que as empresas de plano de saúde são obrigadas a fornecer cobertura para o tratamento do autismo.

É crucial que as famílias compreendam seus direitos e estejam preparadas para lutar por eles. A legislação está do lado das pessoas com autismo e seus familiares, e é importante estar ciente disso ao lidar com as empresas de plano de saúde.

Conclusão: Autismo e Planos de Saúde, Uma Jornada de Conscientização e Direitos

Agora que você entende melhor sobre o autismo, a legislação brasileira que protege esses indivíduos e como isso se aplica aos planos de saúde, esperamos que se sinta mais capacitado e motivado a garantir que esses direitos sejam cumpridos. Lembre-se, a luta pelo direito ao tratamento adequado, sem carências exorbitantes, é uma luta por dignidade e respeito.

A conscientização sobre o autismo é um passo crucial para a criação de uma sociedade mais inclusiva. Ainda há muito estigma, desinformação e preconceito em relação ao autismo, e isso precisa mudar. O conhecimento é uma ferramenta poderosa para quebrar essas barreiras e promover a inclusão e a aceitação.

Esperamos que este artigo tenha sido esclarecedor e que possa servir como um recurso útil para você, seja como pai, educador, profissional de saúde ou alguém interessado em aprender mais sobre o assunto. Juntos, podemos fazer a diferença na vida das pessoas com autismo.

Perguntas Frequentes

  1. O que é autismo?
    O autismo, ou Transtorno do Espectro Autista, é uma condição neurodivergente que afeta a maneira como uma pessoa se comunica e interage com o mundo.
  2. Qual lei protege os direitos das pessoas com autismo no Brasil?
    A Lei Federal 12.764, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, é a principal lei que protege os direitos das pessoas com autismo no Brasil.
  3. Os planos de saúde podem negar cobertura para o tratamento do autismo?
    Não, os planos de saúde no Brasil são obrigados por lei a cobrir o tratamento do autismo, sem período de carência.
  4. O que fazer se o plano de saúde recusar a cobertura?
    Se o plano de saúde recusar a cobertura do tratamento para autismo, você deve buscar assistência jurídica para garantir o cumprimento da lei.
  5. Como posso contribuir para a conscientização sobre o autismo?
    Você pode contribuir para a conscientização sobre o autismo ao se educar sobre o assunto e compartilhar esse conhecimento com outras pessoas. Ajudar a desmistificar o autismo e promover a inclusão é uma responsabilidade de todos nós.

Dra. Patrícia Wanderley

Além de advogada, nossa especialista também é colunista no Jusbrasil.